Parece-me indispensável que o debate acerca da IVG (Interrupção Voluntária da Gravidez) seja conduzido de forma esclarecedora, elevada e incida sobre aquela que é a pergunta a referendar no próximo dia 11 de Fevereiro.
Sem escamotear que do lado do SIM possam existir alguns comentários mais excessivos, parece-me claro o desvio geral e constante da essência da questão por parte dos defensores do NÃO.
O que se pergunta é o seguinte:
Concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, se realizada, por opção da mulher, nas primeiras dez semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?
A pergunta é clara! Não pergunta se concorda que o aborto exista, porque isso nós sabemos que existe e as estatísticas dizem-nos que entre 16.000 e 20.000 abortos clandestinos são praticados por ano, sendo que este é um número talvez por baixo pois há casos que são demasiado encobertos para aparecerem nas estatísticas; Não pergunta se os comunistas tem ou não razão quando defendem o SIM, nem pergunta se esta despenalização vai contra a doutrina religiosa ou não.
O que se pergunta entre outras coisas é:
Deve-se continuar a permitir que milhares de mulheres continuem a abortar clandestinamente em clinicas de “vão de escada” com todos os riscos daí inerentes?
Deve-se permitir que a lei não tenha o mesmo peso em função dos extractos sociais? Porque quem tem dinheiro vai a espanha “passar uns dias de férias” e vem de lá com a IVG consumada sem que ninguém saiba.
Deve manter-se em vigor a hipocrisia da lei actual que não passa de uma contradição inconcebível num estado de direito, em que a lei existe mas não é cumprida? Porque a lei pune com cadeia até 3 anos quem aborte e quem ajude a abortar mas poucos Juizes a fazem valer.
Deve a mulher ter direito à liberdade individual e pessoal sobre o seu corpo, podendo decidir sobre si, ou deve o estado impor a sua vontade sobrepondo-se a este direito?
É esta realidade que se pretende referendar, se deve manter-se ou alterar este “status”.
Pela parte que me toca, defendo o fim desta hipocrisia da sociedade, desta falsa moralidade, e exponho algumas razões:
É um dado adquirido que a ilegalidade não resolveu até agora o problema da IVG e é claro que não vai resolver-lo no futuro porque a IVG não é uma questão de lei , mas sim de consciência e de razões próprias, cabe a cada mulher perante a realidade que enfrenta decidir se deve ou não fazer esta opção, e nem o estado nem a sociedade tem o direito de decidir por ela.
A despenalização não vai obrigar nenhuma mulher a abortar, ao contrário do que erradamente acontece neste momento em que a lei empurra a mulher para a clandestinidade ou para o estrangeiro.
A despenalização da IVG poderá proporcionar um acompanhamento mais eficaz da Mulher que vai abortar, até na oportunidade de tentar alterar a sua opinião colocando-lhe outras hipóteses e disponibilizando-lhe apoio, esta alternativa jamais será possivel na clandestinidade.
Para mim, um ser humano só deve ser posto no mundo de forma responsável e desejada, porque estas são condições importantes para assegurar uma vida digna ao novo habitante.
Defendo, como sempre defendi:
- A implementação rapida e determinada da educação sexual nas escolas;
- Um ensino escolar de qualidade capaz não só de formar e doutorar mas também de consciencializar, de transmitir valores, e acima de tudo acessível a todos;
- Gabinetes de apoio e aconselhamento aos adolescentes nas escolas;
- Um planeamento familiar efectivo, que não se coaduna com o estado de privatização da saúde em curso, com o encerramento de maternidades, centros de saúde e hospitais, nem com o cada vez maior número de utentes sem médico de família;
- Um sistema de segurança e solidariedade social que permitam uma maior estabilidade aos cidadãos perante as situações de desemprego, de doença ou outro qualquer precalço;
- Leis que permitam menos precarização do emprego, salários dignos e que permitam aos pais estarem mais tempo com os filhos podendo assim transmitir-lhes valores que começam a escassear na actual sociedade;
- Leis que protejam a maternidade das mulheres no seu emprego;
- Atribuição de abonos decentes para a maternidade e apoio ao crescimento dos filhos incentivando assim a natalidade;
Se os defensores do NÃO quizerem discutir o aborto em si, estas e muitas outras, são medidas que devem ser postas á discussão e que a meu ver podem fazer baixar as taxas de IVG. Mas não é de certeza pela penalização que a IVG deixa de existir.
Curiosamente, muitos dos que defendem o NÃO são provavelmente os mesmos que tem votado e levado ao poder os governos que não tem sido, nem vão ser capazes de pôr em prática esta tipo de politica de combate ao aborto e à exclusão social.
Alguns argumentos do NÃO têm-me deixado espantado, uns discutem se o feto até às 10 semanas tem vida ou não, alguns não conseguem distanciar a sua luta pelo NÃO do combate ao PCP e outras forças partidárias de esquerda, outros alegam razões de doutrina religiosa e moralidades para condenar a IVG, enfim, tudo menos a verdadeira questão.
E falando de perplexidade, trago ao texto o outdoor dos defensores do NÃO “Contribuir com os meus impostos para financiar clínicas de aborto?”
Não sabem eles que as consequências de muitos dos abortos clandestinos obrigam a tratamentos posteriores no sistema nacional de saúde? Não tem custos?
Não sabem eles que se a lei for escrupulosamente cumprida, as milhares de pessoas que teriam que ser presas também teriam custos para os estado?
Ao que chega a falta de argumentos...
Sobre isto, não resisto à citação de Julio Machado Vaz que escrevia no seu blog “Murcon” o seguinte:
Não posso estar mais de acordo.
Talvez fosse mais importante que os movimentos do NÃO divulgassem o que fizeram nos últimos anos para atenuar as consequências do aborto clandestino, isso sim, pode ser um argumento válido para esta discussão e já agora, divulgassem também os resultados obtidos.
A menos que se aplique aqui aquela velha frase,
“Bem prega Frei Tomás, olha para o que ele diz, não olhes para o que ele faz.”
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